Voltei

Então, eu voltei.

E como já era esperado, estou levando um tempo pra aterrizar (o que se agrava pelo fato de eu não querer muito que isso aconteça), mesmo com os fatores mais evidentes e impactantes sinalizando que de fato estou de volta: mormacinho tropical, rinite atacada, poder chamar o garçom super sorridente e pedir uma cervejinha em bom português – e isso é realmente algo surpreendente, afinal o primeiro ímpeto é chamar o seu Calixto, do Genésio, e perguntar se ele pode s’il vous plaît rapporter de la bière, merci.

Porém, a despeito dessas circunstâncias, o que têm mais anunciado a minha volta são indícios menos óbvios, mas constantes: cobranças. Mas por que raios querem tanto que eu “volte”? Volte a incorporar todos aqueles padrões com os quais todo cidadão paulistano standard não vive sem?

Chegou a hora do esperado momento das reações inconformadas quando eu digo que prefiro não ter um carro num futuro próximo (“mas você vai precisar de um carro, quero ver até quando você aguenta, você acha que aqui é como na Europa, plano, seguro?…”), além do batalhão de indagações que normalmente giram em torno de trabalho, mas não dos meus sonhos e aspirações depois de eu ter ido lá longe colher conhecimentos, e sim da atividade necessária e garantidora da minha subsistência.

Não queria que isso soasse como desabafo, mas acho mesmo curioso, interessante pra caramba essa necessidade que o entorno tem de se assegurar que você vai voltar a viver em consonância com certos modelos que nem mesmo elas sabem ao certo por quê incorporam com tanta obstinação.

Sinto é que existe (ou deveria existir), além destas questões todas que todo mundo faz, uma lista recheada de curiosidades muito mais relevantes, necessárias, fundamentais sobre as coisas que eu trouxe de volta pro Brasil. Mas o mundo parece continuar querendo girar em torno do eixo irrelevante.

Se quiserem saber quais foram as experiências, os aprendizados, as sensações, as perspectivas, as coisas mágicas e o que me foi aberto vivendo num mundo totalmente discrepante do qual eu sempre vivi, vou abrir um sorriso e vamos ficar horas conversando. Se alguém quiser se certificar o quanto eu estou voltando pro mundo “normal” e pré-estabelecido de regras estapafúrdias, vou tentar responder o que elas querem ouvir – é mais fácil e menos propício o início de uma discussão que a nada vai levar.

Não estou fechada pra qualquer possibilidade na vida. A única coisa para a qual estou fechada, ou melhor, trancafiada, é voltar a viver dentro da bolha, com essa série de imposições que as pessoas estabeleceram como essenciais e que não fazem mais sentido pra mim.

Um emprego num dos escritórios mais concorridos de direito, carrão na garagem, me cercar de bens ostensivos, morar sozinha num apartamento pra conquistar a minha “liberdade”, dar uma festa de casamento de 500 mil reais (na qual o noivo é um mero adorno), me cercar de toda essa parafernália consumista e padronizada, são coisas que, hoje, por si só, não vão me trazer felicidade.

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