Caro Rio de Janeiro,
Decidi te deixar, vou voltar pra minha terra. Reconheço, sou quadrada demais pros seus padrões, além de que pastel de feira, dog prensado com purê e o movimento mano me fazem a maior falta.
Foi um deleite a estada na sua zona (sul).
Vou sentir falta do seu visual de tirar o fôlego, do sol de todos os dias, do bronze mata-paulista-de-inveja e dos meus 3 kilos a menos.
Do seu charme inigualável.
Sentirei falta da sua integração, de ver suas ruas cheias de pessoas te usufruindo, te curtindo, se misturando, ao invés delas enclausuradas em seus apartamentos e clubes particulares.
Vou sentir falta de ser mais saudável, ir ao boteco e ter a opção de beliscar um franguinho sequinho com gengibre e de ter o nariz descongestionado.
Sentirei falta de pessoas menos estressadas e que estão dispostas a se redimir ao primeiro sinal de má educação – ao contrário dos meus conterrâneos que tem total consciência do que estão fazendo mas dificilmente tem a nobreza de dizer um “foi mal”.
Sentirei imensa falta de chegar as 10 horas da manhã pra trabalhar e ser uma das primeiras a chegar.
Vou sentir falta de ir pra São Paulo nos finais de semana e achar que estou chegando numa cidade super civilizada, encontrar metros limpos, pessoas à direita na escada rolante, cidadãos esperando os demais saírem do vagão pra depois entrar, motoristas obedecendo o sinal de pedestre (e tenho medo de não mais sentir este impacto e voltar a achar São Paulo um terror).
Muita falta das suas rodas de samba bares afora. E de passar o final de semana inteiro de chinelo e biquini. Da praia pro boteco, do boteco pra praia. Finais de semanas encantados e despretensiosos.
Sentirei falta de encontrar Jorges Ben Jores na ponte aérea.
Imensa falta da sua empadinha, Belmonte!
E também das pessoas que você colocou no meu caminho. Cearenses, Baianos, Mineiros, Gaúchos e até Cariocas. Que enriqueceram, cada um a sua maneira, a minha estada e, mais uma vez, a minha forma de olhar o mundo. Que me mostraram o quanto de riqueza existe além da nossa bolha e quão especiais podem ser as pessoas que não fazem parte da nossa zona confortável.
Não vou sentir falta da sua mania de andar na diagonal e de ser diariamente abalroada pelos seus transeuntes.
Nenhuma falta de ter que ficar desviando dos seus bueiros.
De pagar dois mil reais de aluguel e ainda morar mal.
Não sentirei falta dos seus habitantes bombados correndo nas esteiras sob o ar condicionado das ‘douze’ academias de cada quarteirão, com a orla de Copacabana dando sopa logo ao lado.
Não sentirei falta da sua folga e má educação institucionalizada, de berço – ao contrário dos meus conterrâneos, que até tem educação, mas prefere não utilizá-la, deliberadamente.
Não vou sentir falta de escutar, TODOS os dias durante o almoço, nas mesas vizinhas, papos incessantes sobre os atributos das mulheres ao redor, tampouco dos papos parecidos com diálogos da novela Malhação – açaíe, gatinhash, suplementosh, ondash iradash.
Não sentirei falta de achar que vou falecer toda vez que pego um dos seus ônibus e táxis camicases.
Não vou sentir falta dos seus garçons, Belmonte!
Grata pela acolhida. Foi inesquecível e seguramente uma das melhores fases da vida. Desculpa qualquer coisa.
Até um dia.
S.