Devaneios existenciais jurídicos intempestivos

Aos 30 anos de idade a confusão que normalmente acomete as pessoas dos vinte e poucos pegou a mim de jeito – a indecisão instigada pelos sinais vindos da alma para decidir definitivamente pelo futuro da carreira.

Jogar tudo pro ar, seguir os talentos que as pessoas reconhecem em mim – mamãe, irmãos, namorado e pessoas que não são daqui. Viver aquela vida idealizada e um levemente lunática, porém apaixonada, intensa. Deixar o Direito de lado e me tornar uma escritora full time.

Nunca achei que combinava muito com o mundo do Direito, pelo menos aquele com o qual eu sempre tive contato desde a faculdade. Tailleurs, camisas engomadas, abotoaduras, bolsas de grife ornando com o sapato. Muitas vezes pequenos poderes, prepotências, superioridade. Elitismo, trabalho para poucos e mais ricos (os que tem condições de pagar honorários por hora), comum desconexão com a função social do Direito.

Pois bem, tentei várias coisas nestes últimos tempos. Mandei meu currículo pro Estadão, pra Folha, aceitava um estágio, fiz um curso de escrita criativa. Até na Bienal do Livro eu trabalhei, na esperança de que alguma editora ou editor olheiro identificasse em mim a próxima Elizabeth Gilbert.

Não rolou.

O que rolou foi a percepção de que escritor no meu estilo ainda morre de fome no Brasil. E que é muito bom ter dinheiro, viajar, poder comprar coisinhas, morar na Vila Madalena e não ter que contar dinheiro para se divertir.

Impulsionada pelo fato de que precisava sobreviver, resolvi me jogar de novo no Direito. Afinal, não é só o Direito. É uma carreira bacana de muitos anos que foi construída com bastante investimento.

Como disse minha prima jornalista semana retrasada, “Então você voltou a clinicar?” Voltei.

Mas depois de algum tempo “clinicando”, retornando à rotina louca afobada dos escritórios de direito, voltei a me dar conta de que é preciso muito pensamento fora da caixinha, talento e criatividade para conseguir ser um bom advogado. Dá pra viver esse mundo e ainda ser aberto às demandas sociais coletivas e cumprir com o verdadeiro propósito da profissão.

Alguém me fez a mesma pergunta pela enésima vez um dia desses (o que não me causa nenhum incômodo pois eu gosto de parecer descolada), se eu era jornalista. Não! Eu gosto de argumentar, questionar, analisar, ler, debater, insistir, colocar todos os pontos, esmiuçar, atormentar, bater o pé. Talvez seja por isso que esse dilema profissional bateu só agora, depois de 12 anos no Direito. Porque no final das contas acho que sempre me encaixei nisso tudo.

Enquanto eu não conseguir também virar uma escritora, ou blogueira contratada por algum jornal ou revista, por favor, não me chamem de coxinha, por gentileza, não achem que eu combino bolsa com sapato e que não me rebelo contra os padrões estabelecidos neste mundo elitizado e pouco eficaz para as verdadeiras demandas sociais. Afinal de contas, como uma boa advogada, eu me preocupo muito com a minha imagem.

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