Sobre o belga

Pequenas preliminares conclusões, relevantes ou não, fúteis ou não, pessoais ou não, sobre este particular povoado da Europa ocidental.

1. Já encontrei chocolate belga por todos os lados, cerveja belga em todas as esquinas, mas e o SER belga, onde se encontra? Essa espécie é uma raridade por Bruxelas, a capital do país. Dos poucos que conheço – dois ou três -, não entendi ainda se são uma espécie de pseudo-franceses-holandesados ou se flamengos-meio-afrancesados. Um pouco difícil.

2. Tem uma forma de identificá-los sim: a polidez. O Francês fala “bom dia” ao entrar em qualquer lugar, agradece o motorista do ônibus e pede desculpas por ter esbarrado num fio de cabelo seu – pardon, pardon, pardon! O belga está pouco se ferrando pro mundo. Grosseria – essa é a forma como os tenho identificado no meio da multidão.

3. Outra forma de identificação: são ciclotímicos. Já ouvi falar que o motivo seria o clima, que varia muito – mas muito MESMO. O tempo durante o dia oscila, com intervalos de 10 a 20 minutos, do sol de rachar à tempestades glaciais. E, por conta desta característica, o povo também sofreria de um distúrbio de temperamento, que oscilaria de um extremo ao outro. Isso faz com que eles variem do lord ao estúpido com uma rapidez maior até que a dos Abduches (minha família paterna), impressionante.

4. Além do chocolate, da cerveja, da batatinha frita (existe uma tensão entre a Bélgica e a França no que concerne a invenção da iguaria!) e do diamante, o belga é SUPER orgulhoso por ser o idealizador de Tintin e Smurfs (“Schtroumpfs” na Bélgica), dentre outros desenhos famosos. Nunca fui em tanta exposição de desenho animado.

5. Este tópico tem a ver com higiene. Mas acho que esta pequena conclusão abrange a Europa como um todo. Primeiro que encontrar cotonete e fio-dental pra comprar é tão difícil quanto encontrar uma picanha ou um pão de queijo por aqui.

Mas o que me chocou esses dias foi um amigo bem próximo, que mora em Bruxelas há um certo tempo e que, entre um assunto e outro, se disse “preocupado” pois fazia três dias que não tomava banho, por “falta de tempo”, explicando que sua vida estava corrida: trabalho, tese do mestrado, festas com os amigos. Com tantas tarefas quem é que consegue, não é mesmo?, pensei eu. O mais chocante foi que ele disse isso como se estivesse contando que fazia três dias que não ía à academia ou algo do gênero. Tudo bem, ele vem lá do leste europeu, aonde talvez a falta de banho tenha uma certa justificativa climática. Mas já entramos no verão por aqui há quase um mês…

6. Estilo: também acho que essa conclusão tem muito mais a ver com o estilo europeu no geral. Eu gosto muito da mentalidade europeia ao se vestir. Fico vidrada quando vejo por aí o pessoal misturando estampa de todas as formas. Tipo camisa xadrez com um lenço listrado ou de qualquer outra estampa. Muita gente acha estranho, e realmente não é qualquer combinação que fica legal.

Estava comentando isso com uma amiga que mora na França há 8 anos e ela me disse que muitas vezes a mistura não era proposital, o fato é que simplesmente o europeu tem 2 camisas, 2 calças jeans, uma bota no armário, 2 lenços, ou seja, combinar ali fica em segundo plano e não há um leque tão variado assim para se dar ao luxo de combinar todas as peças e, como amam coisas coloridas e estampadas, aí que fica impossível mesmo. Essa é uma pequena conclusão fútil, mas confesso uma das que eu mais gosto.

7. O que se ouve. Como o país é dividido basicamente entre holandeses e franceses, isso transmite à atmosfera da cidade todo o charme tradicionalista/retro francês, bem como o descolado e desencanado estilo holandês. Nas rádios a diferença é óbvia, as francófonas tocam os mesmos sucessos de 1950 todos os dias, na mesma sequência, enquanto que as flamengas as recheiam de rock, indies e mais modernitudes mundiais. Mas tem espaço pra tudo. Ou seja, a cidade toda é recheada por bistrozinhos e também por porões alternativos. Gosto, gosto e gosto.

8. Eita povo impaciente. Eu me sinto uma baiana perto do belga. Eles fazem tudo rápido: ao falar, ao escolher a comida no cardápio, o que vão beber, no trânsito, nas compras do supermercado, ao telefone. E quando se hesita pra escolher alguma coisa no restaurante então? Quem me conhece bem, deve imaginar como sofro com isso. Gosto de ler todo o cardápio antes de escolher, fico 10 minutos comparando as mostardas na prateleira do supermercado, definitivamente não sou de fazer escolhas rápidas. E eles não têm muita paciência comigo.

9. Nós, brasileiros, em geral, temos uma característica: não gostamos muito de horário. E isso é um ponto sensível entre os dois povos. A real é que, no meu bem entender, eles são metódicos demais.

E quando me convidam para fazer algum programa, um programa simples, como por exemplo ir ao cinema, dali a 10 dias, às 19 horas? E ainda esperam uma resposta exata. E se eu não estiver a fim no dia?

Dia desses, ao acordar, foi me feita a seguinte pergunta: “Você vai com a gente ao cinema hoje à  noite?“, eu respondi “Não, tenho um happy hour“, eis que veio a segunda pertunga: “Quanto tempo você vai ficar no happy hour?”. Ah, meu amigo… “3 horas, 14 minutos e 2 segundos” foi a resposta. Junte-se toda a minha brasileirice ao meu humor matinal, até que eu peguei leve. Acho que estou ficando cada dia mais tolerante.

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